sexta-feira, 29 de março de 2024

RECURSO INOMINADO - DE APELAÇÃO EM JECRIM - DESACATO

 

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DO JUÍZO DO JUIZADO ESP. CRIMINAL E DE VIOLÊNCIA DOM. E FAM. CONTRA A MULHER DA COMARCA DEXXXXXXXXXXXX

 


 

 

Autos º 000000000000000

Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA.

AUTOR FATO: XXXXXXXXXXXXX

 

 

  

 

 XXXXXXXXXXXXX, (47 000000000000), já devidamente qualificada no processo em epígrafe, que lhe move o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, vem por meio de sua DEFENSORA DATIVA – nomeada, presença de Vossa Excelência, INTERPOR tempestivamente suas razões de RECURSO INOMINADO, às quais seguem em apartado.

 


Nestes termos,

Pede deferimento.

Blumenau, 29 de março de 2.024.

 

 

 

 

Tuani Ayres Paulo

OAB/SC n.º 37.459[1]

 

 

 

RAZÕES DE RECURSO INOMINADO

 

 

Autos º 000000000

RECORRENTE: XXXXXXXXXXXX

RECORRIDO:  MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA.

 

 

 

 

 

TURMA RECURSAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SANTA CATARINA,

 

 

COLENDA TURMA,

ÍNCLICITOS JULGADORES

 

Insurge-se o Recorrente, através do presente recurso, contra a R. Sentença evento 000 do juízo “a quo”, que julgou procedente a ação com a condenação do recorrente pela prática do crime de desacato (art. 331, caput, do CP). Inconformado com a decisão proferida no juízo “a quo” o Recorrente busca a reforma da decisão de origem, a veneranda decisão Recorrida merece reforma conforme as razões que seguem. No tocante à condenação.

 

 

 

                              I.        SÍNTESE DO PROCESSO

 

 

a)   DA SÍNTESE DA DENÚNCIA

 

Trata de ação penal que imputou ao acusado a prática do no 331, caput, do Código Penal,

 

No dia 18 de fevereiro de 000, por volta das 19h42min, na Rua XXXXXX n. 591, bairro XXXXX, nesta cidade, o denunciado XXXXXX desacatou os Policiais Militares XXXXX e XXXXX, no exercício de suas funções. Na ocasião, a Polícia Militar havia sido acionada para atender a uma ocorrência de perturbação de sossego no endereço acima indicado. E foi assim que o denunciado XXXXX, em abordagem, não colaborou com os procedimentos policiais e, se não bastasse, disse ao Policial Militar XXXXX, em tom desafiador e provocativo, que era para o miliciano "entrar na residência para falar com ele 'se ele fosse homem'". Ato contínuo, o denunciado saiu de sua residência, com uma garrafa de cerveja nas mãos, bradando à guarnição que "a polícia não tinha nada o que fazer no local", além de ter xingar os policiais de "covardes", fazendo gestos com as mãos denotando desprezo à guarnição1 . Por conta do comportamento do denunciado, que ostentava muita agressividade contra a guarnição, foi necessário o uso da força e de spray de pimenta para contê-lo e conduzi-lo algemado até a Central de Polícia.

Ouve audiência de instrução, e fora colhido o depoimento de 01 policial militar que fez a abordagem e conduziu a ocorrência, o depoimento do denunciado restou prejudicado pois não compareceu a sala virtual da audiência, tendo a sua revelia decretada.

 

 

b)   DO RELATÓRIO:

 

O Ministério Público ofereceu denúncia contra XXXXXXXX pela suposta prática do crime previsto no artigo 331, caput, do Código Penal, em razão dos fatos narrados na peça acusatória (ev. 114). Ao acusado foi feita proposta de suspensão condicional do processo (ev. 00), a qual foi aceita (ev. 10), mas, diante do descumprimento, ocorreu a sua revogação (ev. 00).

 

Na audiência de "sursis" processual houve apresentação de defesa preliminar, sendo que o acusado reconheceu a conduta e requereu benefícios da atenuante de pena, em caso de condenação, sendo a denúncia recebida pelo despacho do ev. 199. A audiência de instrução e julgamento foi designada e o acusado foi citado (evs. 248 e 272). Na primeira parte da instrução e julgamento, foram ouvidos XXXX e a testemunha de acusação XXXXX (ev. 281). Foram juntados aos autos vídeos do momento em que os fatos ocorreram, apresentados pelo policial XXXXXXXXX (ev. 296).

 

Na audiência de continuação da instrução, foi ouvida a testemunha XXXXXX e a vítima XXXXXXXXXXX.

 

Bem como foi realizado o interrogatório do réu (ev. 00, momento em que explicou estar fora de casa, saiu devido uma briga entre seus pais, e como era seu dia de folga, optou por não ficar no local, e quando voltou estava com algumas pessoas, como havia ingerido um pouco de bebida alcóolica, ficou alterado quando a polícia chegou ao local, isso porque o barulho que havia não tinha sido realizado pelo mesmo e que ele recém havia chegado, desgostoso com a atitude da polícia de imediato optou por entrar, e após ouvir a fala da polícia com medo não quis ir para fora, o que de fato piorou a situação, pois que mais viaturas foram acionadas.  

 

Reconheceu que deveria ter se apresentado de imediato, mas com medo não o fez na época. E afrontou a polícia pois estavam sendo extremamente grosseiros com sua mãe que nada tinha feito de errado. Em especial, após jogarem o spray de pimenta nela, com isso acabou “surtando” como disse em depoimento, vendo reação da sua mãe.

 

O Ministério Público apresentou alegações finais por memoriais, a defesa também.

 

Sobreveio sentença condenatória. Portanto o Recorrente busca a reforma da R. Sentença contra a condenação, e assim apresenta as Razões de recurso inominado.

 

 

 

 

                           II.        DA DECISÃO RECORRIDA - DA SENTENÇA

 

Desta feita o Juízo a quo entendeu CONDENAÇÃO acusado o, assim, colhe-se da r. sentença:

Assim, não havendo circunstância judicial desfavorável, fixo a pena-base no patamar mínimo previsto em abstrato para o tipo penal, qual seja, em 6 (seis) meses de detenção.

Na segunda fase de dosimetria, não há circunstâncias agravantes a sopesar. Presente a atenuante da confissão, porém deixo de reduzir a pena em virtude do contido na Súmula 231 do STJ.

Na fase derradeira, não há causas gerais e/ou especiais de aumento ou diminuição da pena a incidirem, motivo pelo qual torno definitiva a reprimenda em 6 (seis) meses de detenção.

Fixo o regime aberto para o cumprimento inicial da pena, com fulcro no art. 33, § 2º, "c", e § 3º, do Código Penal.

Visto que preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos consistentes em prestação pecuniária, à razão de 01 (um) salário-mínimo, valor que deverá ser destinado ao Fundo de Transação Penal deste JECRIM/Juizado Especial da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

 Substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, inviável a suspensão da pena a que se refere o disposto no art. 77 do Código Penal.

III - DISPOSITIVO

Do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão acusatória exposta na denúncia, para CONDENAR o acusado EDIVALDO TOMAZ ROSA ao cumprimento da pena de 6 (seis) meses de detenção, em regime aberto, pela prática do delito de desacato (art. 331, caput, do CP).

Preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária, à razão de 1 (um) salário-mínimo, valor que deverá ser destinado ao Fundo de Transação Penal deste JECRIM/Juizado Especial da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

 Substituída a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, inviável a suspensão da pena a que se refere o disposto no art. 77 do Código Penal.

Data vênia, doutos julgadores! A sentença prolatada merece ser REFORMADA, haja vista que, não ter observado todos os aspectos.

 

                         III.        DO DIRETO

 

Em que pese, as prerrogativas conferidas à defesa, é certo dizer que, no presente caso, o conjunto probatório trouxe provas da autoria, pelas testemunhas, muito embora não tenha o fato ocorrido na forma exata como a relatada pela polícia.

 

Pois que houve muita violência por parte da polícia com o acusado e em especial contra sua mãe, pessoa idosa, que na ocasião só tentava ajudar a polícia, que de forma desarrazoada o policial atirou spray de pimenta propositalmente nesta idosa, a fim de causar mais irritação e provocação do aqui acusado, o que consequentemente piorou mais o clima na ocasião. Ação desnecessária e não justificada. Que induziu o acusado a desferir palavras que não seriam ditas.

 

O caso com o devido respeito a entendimentos diversos, requer a dissolução, diante da insignificância da conduta atribuída ao acusado.

 

O princípio da insignificância não se presta gerar impunidade e complacência com o crime mas selecionar as condutas que embora formalmente típicas não atingem de forma relevante bens jurídicos, de modo a autorizar a intervenção do estado.

 

A tipicidade material da conduta, nesse sentido, se verifica qualitativa, quantitativamente, aferindo-se o grau de importância da conduta formalmente típica no mundo jurídico

 

Avalia se, desse modo, o custo-benefício, dá aplicação da insignificância. E observa-se que diante do caso apresentado, a resposta do acusado foi insignificante. Não havendo necessidade de manchar os antecedentes criminais, de uma pessoa de boa índole.

 

Que conforme consta na sentença:

O acusado não registra maus antecedentes. Não há nos autos elementos suficientes para análise da conduta social e da personalidade do acusado. Os motivos não foram suficientemente apurados. As circunstâncias não merecem relevo.

 

[...]

Assim, não havendo circunstância judicial desfavorável, fixo a pena-base no patamar mínimo previsto em abstrato para o tipo penal, qual seja, em 6 (seis) meses de detenção.

Na segunda fase de dosimetria, não há circunstâncias agravantes a sopesar. Presente a atenuante da confissão, porém deixo de reduzir a pena em virtude do contido na Súmula 231 do STJ.

 

Jogar spray de pimenta NUMA IDOSA é brutalidade na verdade. A reação do acusado foi justamente em defesa a agressão a sua mãe.

 

É inescusável que inexistiu qualquer pretensão de desprestigiar ou humilhar o policial. Muito pelo contrário, houve a calourosa discussão, após injusta provocação, justificando a reação à altura do ataque antes perpetrado.

 

E aqui nada se tem falado na acusação, nem pelos depoimentos dos policiais, nem pela promotoria.

 

Desse modo, no mínimo inexiste o dolo específico; sabe-se, essa modalidade penal não admite a forma culposa ponto que está o quadro fático sucedera em estado de necessidade, o que igualmente, não é punível. Artigo 24 do CP.

 

 Com esse enfoque, é altamente ilustrativo colacionar o magistério de Guilherme de Souza Nucci:

 46. Funcionário que provoca a ofensa: não configura desacato se o particular devolve provocação do funcionário público, tendo em vista que não busca desprestigiar a função pública, mas dar resposta ao que julgou indevido...

 

Com a mesma sorte de entendimento, professa Cezar Roberto Bitencourt, in verbis:

Não raro, nos casos de ´desacato´ existe a provocação da autoridade, geralmente policial, na maioria das vezes, propositalmente para encobrir alguma arbitrariedade, forçando o ´pseudodesacato´. A jurisprudência, pelo menos, tem procurado suavizar as arbitrariedades que ocorrem nos discutíveis desacatos perante agentes policiais ou judiciais, decidindo que a repulsa à provocação da autoridade não constitui desacato punível

Seguindo, no particular, o velho magistério de Hungria:

Não haverá crime quando o funcionário tenha dado causa ao ultraje, de modo que este se apresente como uma repulsa justificada, tal como no caso de resistência à execução de ordens ilegais ou executadas com desnecessária violência. 

 

A esse propósito, é de todo oportuno igualmente gizar as lições de Cleber Massonipsis litteris:

Finalmente, não há crime de desacato quando o funcionário tenha dado causa ao ultraje, de modo que este se apresente como uma repulsa justificada, tal como no caso de resistência à execução de ordens ilegais ou executadas com desnecessária violência.

 

                  Em abono às disposições doutrinárias acima evidenciadas, mister se faz trazer à colação os seguintes arestos:

APELAÇÃO CRIMINAL. DESACATO. ARTIGO 331 DO CÓDIGO PENAL. PROVA QUE NÃO SE REVELA SEGURA ACERCA DA EXISTÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO. SENTENÇA CONDENATÓRIA REFORMADA.

É pacífico o entendimento desta turma recursal em relação ao delito de desacato acerca da necessidade do dolo específico, ou seja, que as ofensas proferidas se revistam da intenção de humilhar, desprestigiar o funcionário público no exercício de sua função ou em razão dela a fim de que reste caracterizado o desacato. Hipótese em que não há como afirmar, de forma segura, a presença do dolo específico, o que arreda, diante da existência de dúvida, o juízo condenatório. Dúvida acerca da existência do dolo específico, ou seja, que a intenção do acusado, ao proferir as palavras desrespeitosas aos policiais, era de humilhá-los, menoscabar a função por eles exercida. Recurso provido. (TJRS; Proc. 10893-69.2014.8.21.9000; Quaraí; Turma Recursal Criminal; Rel. Des. Luiz Antonio Alves Capra; Julg. 25/08/2014; DJERS 29/08/2014)

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DESACATO. ARTIGO 331 DO CÓDIGO PENAL. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ORDEM CONCEDIDA.

1. O trancamento da ação penal é medida excepcional que só se justifica quando há manifesta atipicidade da conduta, presença de causa de extinção da punibilidade do paciente ou de ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas evidenciando constrangimento ilegal. 2. O crime de desacato exige dolo específico, a vontade consciente e dirigida à ação de humilhar, de ofender o servidor público, o que não restou evidenciado nos autos porquanto a conduta da paciente, ainda que incompatível com os padrões da boa educação, foi motivada pela insatisfação. Ainda que sem fundamento. Com a rotina dos serviços da secretaria do juízo. Em outras palavras não houve a vontade de ultrajar e desprestigiar a função pública exercida ofendido, daí a atipicidade da conduta. 3. Ordem de habeas corpus concedida para determinar o trancamento da ação penal. (TRF 1ª R.; HC 0027145-75.2014.4.01.0000; RO; Terceira Turma; Rel. Juiz Fed. Conv. Pablo Zuniga Dourado; Julg. 29/07/2014; DJF1 08/08/2014; Pág. 869)

   Em arremate, mostra-se imperiosa a absolvição do Acusado, mais precisamente em razão da ausência de tipicidade penal na conduta visualizada pela acusação. (CPP, art. 386, inc. III)

 

 

 

                          IV.        DOS REQUERIMENTOS:

 

Diante de todo o exposto, requer seja dado provimento ao presente recurso, para que seja reformada a sentença condenatória, ABSOLVENDO O ACUSADO.

 

Nesses termos,

Pede deferimento.

Blumenau, 29 março de 2.024

 

Tuani Ayres Paulo

OAB/SC n.º 37.459[2]



[1] Documento assinado digitalmente Lei nº 11.419/2006, art. 1º, §2º, III

[2] Documento assinado digitalmente Lei nº 11.419/2006, art. 1º, §2º, III

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