O contrato de locação
de coisas é aquele em que, uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo
determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa
retribuição (CC, art.565). Por esta definição legal, podemos destacar que no
contrato de locação de coisas, seus elementos fundamentais são os mesmos do
contrato de compra e venda, quais seja, coisa,
preço e consentimento.
Nossa matéria começa no artigo 565 do Código
Civil de 2002.
Art. 565. Na locação de coisas, uma das
partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de
coisa não fungível, mediante certa retribuição.
É
importante observamos algumas características presentes nesse tipo de contrato.
a)
bilateral, pois envolve prestações
recíprocas, em que uma das partes entrega a coisa para uso e a outra paga pela
utilização;
b)
onerosidade, ambas as partes obtém
proveito, sendo para uma parte o recebimento do valor do aluguel e a outra se
beneficia com o uso da coisa locada;
c)
consensualidade, tendo seu
aperfeiçoamento ou conclusão com o acordo de vontade, sem a necessidade da
imediata tradição da coisa;
d)comutativo, no qual não há risco da
aleatoriedade, pois suas prestações são fixadas e definidas objetivamente;
e)
não solenes, pois a forma de
contratação é livre, podendo inclusive ser feita oralmente;
f)
de trato sucessivo, em que sua
execução é prolongada no tempo.
É
importante mencionarmos também que a locação de coisas pode recair sobre bens
móveis ou bens imóveis, destacando que na hipótese de coisa móvel, esta terá
que ser infungível (veículos, roupas, livros, aparelhagem de som, etc), pois
para as coisas fungíveis (milho, feijão, arroz, café, etc), aplica-se o
contrato de mútuo.
É
bem verdade que poderá ocorrer a locação de coisa móvel fungível quando o seu
uso tenha sido ad pompam vel ostentationem ( para ornamentação), como uma cesta
de frutas, com adornos raros, por exemplo.
É
imprescindível o preço ou valor do aluguel (remuneração) a ser paga pelo
locatário, pois não existindo a cobrança de um preço, não será contrato de
locação, nesse caso teremos a figura do comodato, hipótese em que haveria o
gozo ou uso da coisa gratuitamente.
O
preço normalmente é fixado pelas partes, podendo ainda ser definido por
arbitramento ou por ato governamental.
O
valor da locação deve ser real e não simbólico, determinado ou determinável,
cujo pagamento, regra geral, é feito em dinheiro, podendo, entretanto, ser
efetivado de forma mista, sendo parte em dinheiro e parte em obra
Se
for locação regida pela lei do inquilinato, a fixação do preço não poderá ser
vinculada a moeda estrangeira, nem ao salário mínimo conforme veremos em
artigos específicos da Lei 8.245/91.
Antes de adentramos na análise da Lei de Locações é importante
tecermos breve comentários sobre outras formas de locações, inclusive,
mencionadas tanto no Código Civil quanto no artigo 1º da já citada lei.
O Código Civil de 2002 no seu Livro Complementar, sobre
as disposições finais e transitórias, apresenta importante disposição que
merece interpretação adequada por sua função social e econômica, pois verte
sobre os milhões de prédios submetidos à locação de prédio urbano.
Eis
a disposição legal que ora se comenta: Art. 2.036. A locação
do prédio urbano, que esteja sujeita a lei especial, por esta continua a ser
regida.
Desde
logo, é necessário delimitar a importância do trecho a locação
de prédio urbano que esteja sujeita a lei especial,
como está no transcrito artigo.
Repetindo
o comentário anterior de que a Lei nº 8.245 de
1991, sob a ementa dispõe sobre as locações de
imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes, declarando no seu art. 1º, caput, que a locação de imóvel urbano
regula-se pelo disposto nesta Lei.
Entenda-se
que locação de
prédio urbano seja expressão idêntica à locação
de imóvel urbano, mesmo porque imóvel é
expressão que pode ser tomada como sinônima de
prédio.
Logo
a seguir, o parágrafo único do art. 1º da Lei nº 8.245/91 enuncia:
Continuam
regulados pelo Código Civil
e pelas leis especiais
a)
as locações:
1
– de imóveis de
propriedade da União, dos Estados e dos Municípios, de
suas autarquias e fundações públicas;
2
– de vagas autônomas de
garagem ou de espaços para estacionamento de veículos;
3
– de espaços destinados à publicidade;
4
– em apart-hotéis, hotéis-residência ou equiparados, assim considerados aqueles
que prestam serviços regulares a seus usuários e como tais sejam autorizados a
funcionar.
b)
o arrendamento mercantil, em qualquer de suas modalidades.
Vamos
tecer comentários sobre cada um desses casos:
Quanto
à locação de prédios
públicos urbanos, observa-se que a Constituição de
1988 conferiu às entidades federativas (União, Estados-membros, Municípios e
Distrito Federal – embora este não tenha sido mencionado no
referido parágrafo único) o poder de dispor sobre o
regime jurídico de seus bens inclusive imóveis, o
que se pode verificar pela ausência de previsão de legislação privativa ou complementar da União nos
arts. 22 e 24 da Carta Magna.
Mas
a Constituição brasileira − instituindo o nosso peculiar Pacto Federativo, que
compreende três esferas governamentais, União, Estados e Municípios − limita a
autonomia legislativa das entidades federativas, pois declara, por exemplo, que
os bens públicos não podem ser usucapidos (art. 183, § 3º, art. 191, parágrafo
único) e que as contratações realizadas pelo Poder Público devem obedecer ao
procedimento licitatório (art. 37, XXI).
No aspecto de previsão das
entidades federativas, a disposição do art. 98 do Código
Civil de 2002, o qual já foi obejto de estudo, se mostra muito
mais superior – mesmo porque correspondeu à lenta evolução da compreensão do
papel do Poder Público –, ao que estava no art. 65
do Código Civil de 1916, porque agora se declara que são públicos os
bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são
particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.
Note-se
que no âmbito normativo decorrente do disposto no art. 98 do Código Civil estão a União, os Estados-membros, os Municípios e
o Distrito Federal, inclusive as suas autarquias e fundações, que também são
pessoas jurídicas de direito público, criadas por
lei específica do ente federativo.
Enfim,
do que se tem hoje do ponto de vista
constitucional, a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, sempre
através de lei votada por seus corpos legislativos
em face do princípio da legalidade decorrente do art. 37 da Lei Maior, poderão
dispor até mesmo sobre o regime de locação dos seus imóveis – e até mesmo adotar, mediante
licitação, as regras da Lei nº 8.245/91 − desde, evidentemente, que assegurem o
regime de competição ao entabular os contratos,
através de procedimentos licitatórios, exigido pelo
disposto no art. 37, XXI, da Constituição.
No
segundo tópico temos as vagas de garagem - A locação
de vagas de garagem
pode ser feita como acessório à locação residencial
ou não residencial do imóvel (apartamento, sala, casa, galpão etc.) ou de forma autônoma, como, por exemplo de vagas de garagem em
edifícios residenciais a terceiros, se tal for permitido pela convenção
condominial ou regulamentação própria.
Vide
Código Civil de 2002:
Art.
1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e
partes que são propriedade comum dos condôminos.
§
1º As partes suscetíveis de utilização
independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas, sobrelojas ou
abrigos para veículos, com as respectivas frações ideais no
solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo
ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários.
Passamos
a ter pelo novo Código Civil,
a possibilidade do proprietário do apartamento, a despeito de anterior proibição constante na respectiva convenção,
alugar somente a vaga de garagem.
É
importante lembrarmos que o regime condominial implantado pelo novo Código Civil substitui o que
está na Lei nº 4.591, de 16 de
dezembro de 1964, que dispõe sobre o condomínio
em edificações e as incorporações imobiliárias, lei que somente continua
subsistente na parte referente às incorporações imobiliárias.
As
disposições legais sobre condomínios constituem normas estatutárias, no sentido de criarem o status
de condômino edilício, assim na linha de orientação de Maurice
Hauriou e Gastón Jéze, estes a distinguir entre ato-regra (no caso, o Código Civil e as convenções condominiais, aquele predominando
sobre este), ato-condição (que é o ato individual através do qual se ingressa
na situação fática regulada pelo ato-regra, como, no
caso, a aquisição da unidade pelo novo condômino) e ato-individual (este aquele
em que predomina, com intenso fulgor, a autonomia individual, posto que
pronunciado nos limites deferido pela ordem jurídica).
Daí
pode-se afirmar: inexiste direito adquirido em face de
normas estatutárias.
Portanto,
não se pode afrontar as normas estatutárias com as situações pessoais já
existentes, sendo elas imunes à alegação de direito
adquirido por parte daqueles proprietários que, embasados em normas
convencionais ou mesmo em normas da anterior legislação, possam entender, por
exemplo, que não podem ser apenados com as sanções do art. 1.337, posto que
este inovou situação que antes não estava prevista nas normas convencionais, ou
que possa favorecer os estranhos na locação da vaga
de garagem, a despeito da disposição que se vê no art. 1.338,
a favorecer os moradores em face dos estranhos.
É
certo que o condômino tem o direito de usar,
fruir e livremente dispor das suas unidades (art. 1.335, I), mas também tem
o dever de dar às suas partes a mesma destinação
que tem a edificação, e não as utilizar de maneira
prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons
costumes (art. 1.336, IV).
Em
locação autônoma ou acessória de
vaga de garagem em condomínio edilício, se esta se
apresentar nociva aos demais condôminos ou compossuidores, o locador estará
submetido às sanções do § 2º do art. 1.336, e ele e o seu inquilino, possuidor
direto da vaga, às sanções do art. 1.337. O que importa, aqui, como em toda a
relação de vizinhança, são os valores contidos nos
§ 3º, isto é, sossego, salubridade e segurança do grupo
social envolvido.
Em
outro tópico temos a locação de
espaços destinados à publicidade, submetida ao regime da locação
de coisas do Código Civil, locador e inquilino estão vinculados pelo que contrataram,
mas deverão estar submetidos às regras do poder de
polícia que a ordem jurídica, nos arts. 29 e 30 da Constituição, mediante lei
votada pelo corpo legislativo, concede às Autoridades Municipais na regulação
do interesse local.
No tratamento das locações envolvendo os apart-hotéis e
similares, foi bem colocada a exceção dada pela Lei nº 8.245/91 em face das
características peculiares deste contrato, em que, muito mais que a cessão de uso e gozo que caracteriza a locação,
avulta a prestação dos serviços que se faz ao inquilino, em caráter empresarial
e de modo cada vez mais complexo no atendimento de suas
necessidades.
A
rigidez da relação jurídica da locação urbana
residencial, temporária e não residencial, reguladas pelo Estatuto do
Inquilinato Urbano, com prazos e restrições de
garantias a que estão jungidas as partes não se mostra adequada no tratamento dos serviços prestados em apart-hotéis e
outros, os quais ficam, assim, sob a regulação da autonomia da vontade, em face
da inexistência de lei federal dispondo sobre o
tema.
Também
quanto ao arrendamento mercantil, continua este regido pela lei específica em
face de seu nítido caráter comercial e assim
volúvel em tempos de acelerado crescimento das
atividades empresariais; neste aspecto, basta notar que o leasing ou
arrendamento mercantil é hoje o grande instrumento jurídico que permite
principalmente às empresas a aquisição e utilização de
máquinas e bens duráveis essenciais à sua atividade, inclusive propiciando que
não se imobilize capital em aparelhamento que logo se vê obsoleto pela
superveniência de outros mais adequado.
O
arrendamento mercantil é regulado pela Lei nº 6.099, de
1974, e disposições do Banco Central, e não foi extinto pela superveniência da
Súmula nº 263, do Superior Tribunal de Justiça: A
cobrança antecipada do valor residual (VRG) descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil, transformando-o em compra e
venda a prestação, não só porque ainda hoje se admite leasing sem
cobrança antecipada do valor residual (o que acaba por conspirar contra o
arrendatário) como, também, pelo poder concedido no
art. 1.197 do novo Código Civil:
a posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu
poder, temporariamente, em virtude de direito
pessoal, ou real, não obsta a indireta, de quem
aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o
indireto.
O
arrendatário é possuidor direto da coisa, a qual recebeu pelo contrato, em que
reconhece a posse indireta do arrendador; em sendo indireta a posse do
arrendador, poderá este também se socorrer dos remédios possessórios, inclusive
a liminar de reintegração de
posse em caso de inadimplemento do arrendatário.
O ponto acima
– arrendamento mercantil – não propriamente objeto do nosso conteúdo portanto,
limitamo-nos a tecer pequeno comentário.
Feito um
pequeno intróito sobre o tema “ locações de coisas móveis” vamos aprofundar
nossa reflexão sobre a locações de imóveis residenciais, trabalhando
especificamente a já cita lei de locações.
Referências: CC 2002.