EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A)
DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL E DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
CONTRA A MULHER DA COMARCA DE xxxxxxxxxx
Neste processo o réu construiu em app, e menos de 2m de córrego, no caso dos autos um esgoto, sendo que parte da rua foi tubulada, e na área do réu não. A defesa é com base na omissão do município. O MP pediu a demolição da área, e recuperação.
AÇÃO PENAL -
PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO Nº 5020910-27.2022.8.24.0008/SC
AUTOR: MINISTÉRIO
PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
ACUSADO: XXXXXXXX
XXXXXXXXXX, devidamente
qualificado no processo em epígrafe, que lhes move o MINISTÉRIO
PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, VEM por sua defensora devidamente, respeitosamente
à presença de Vossa Excelência apresentar:
ALEGAÇÕES FINAIS
Com base nos fatos e
fundamentos jurídicos a seguir expostos:
I.
SÍNTESE DO PROCESSO
O Ministério Público
propôs ação com pedido de demolição de imóvel residencial, sob a alegação de
dano ambiental decorrente de construção às margens de um rio. O imóvel em
questão, pertencente ao Requerente, situa-se em área onde, conforme demonstrado
nos autos, a Prefeitura realizou a tubulação do esgoto em trechos específicos,
excluindo, contudo, a área onde se localiza a residência do Requerente e de
outros imóveis em situação semelhante.
II.
DOS FATOS
A casa do Requerente
foi construída em área onde, assim como nas demais construções vizinhas, não
houve a devida implementação de infraestrutura de tubulação
pela Prefeitura, apesar de ter sido iniciado o processo em outras partes da
rua. Essa omissão resultou na atual situação, onde o esgoto passa
a céu aberto, afetando todas as residências da localidade.
A área em questão,
conforme demonstrado por fotos, foi parcialmente tubulada pela Prefeitura, que,
por razões não atribuíveis ao Requerente, desistiu de continuar a obra,
deixando a tubulação incompleta e causando, assim, uma situação de desigualdade
e injustiça em relação ao Requerente.
Importante frisar que
a situação do Requerente não é isolada, visto que todas as
casas da vizinhança se encontram em condição semelhante, sem que haja
fiscalização ou exigência de demolição por parte do poder público.
III.
DA INEXISTÊNCIA DE DANO AMBIENTAL
As fotos já anexadas
aos autos comprovam inequivocamente que a residência do Requerente, bem
como as demais construções na vizinhança, encontra-se em situação idêntica,
estando algumas até mesmo sobre a área já tubulada, sem que haja
qualquer indício de dano ambiental decorrente dessa situação.
Importante ressaltar
que a área onde se situa a residência do Requerente foi negligenciada
pela Prefeitura, que, apesar de iniciar a obra de tubulação, não a
concluiu, deixando os imóveis do declive, incluindo o do Requerente, em uma
situação de vulnerabilidade.
Ademais, não há prova concreta de
que a construção do Requerente tenha causado dano ambiental, especialmente considerando
que a área já se encontrava degradada pela falta de infraestrutura
adequada.
IV.
DA OMISSÃO DA PREFEITURA
A omissão da
Prefeitura em não completar a tubulação e, posteriormente, exigir a demolição
de construções realizadas em áreas não tubuladas, configura uma clara ação de
negligência por parte do poder público, que não pode ser ignorada.
Afinal, a omissão da
Prefeitura em não concluir a obra de tubulação na área em declive constitui a
verdadeira causa da situação atua, é o cerne da questão.
Tal omissão não pode ser motivo para penalizar
exclusivamente o Requerente, que, de boa-fé, construiu sua residência em área
que, a seu ver e conforme práticas comuns observadas na localidade, seria
posteriormente regularizada pela administração pública, sendo injusto
penalizar o Requerente, que confiou na administração pública para a
regularização e infraestrutura de sua moradia.
É importante ressaltar
que, conforme o princípio da isonomia, não é razoável nem justo que apenas o
Requerente seja penalizado com a demolição de sua residência, quando evidências
claras indicam que a situação de sua propriedade não difere daquelas ao seu
redor.
Nesse sentido a
exigência de regularização do imóvel pelo Ministério Público, sem que haja a
devida fiscalização e notificação das demais residências em situação
semelhante, caracteriza um flagrante desigualdade de tratamento,
violando o princípio da isonomia.
Assim, tratando-se de
área urbana consolidada, com poucos terrenos sem construções, não parece
razoável responsabilizar o réu, que ergueu apenas uma área de alvenaria em cima
de um porão em que já havia calçada a muitos anos, sem maiores impactos
ambientais, enquanto nas demais áreas da região foram erguidas casas e outras obras
de maior monta. Só porque há tubulação.
Portanto, se trata de
ponderação de valores que determina a anulação da proteção ao meio-ambiente,
melhor protegia tal bem jurídico, tendo em vista que, como já referido, a
demolição pretendida causaria mais danos do que benefícios. E inexistindo dano
propriamente dito causado pela realização da obra, também não há
responsabilidade civil por parte do réu.
V.
DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS
a)
Da Constituição Federal 1988
A Constituição
Federal, em seu artigo 5º, assegura o direito à moradia como um
dos fundamentos para a promoção da dignidade da pessoa humana.
Destarte, exigir a demolição da casa do Requerente, única moradia e
fruto do investimento de uma vida, sem oferecer alternativas viáveis, viola princípios
constitucionais básicos.
O art. 225 da
Constituição Federal estabelece que todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, sendo dever do poder público e da coletividade
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. No entanto, é
imperativo considerar que a responsabilidade pela preservação não pode
recair de forma desproporcional sobre o cidadão, especialmente quando a
omissão do poder público é um fator contribuinte para a situação.
Princípio da Prevenção
e Precaução
As medidas adotadas pela construção estão
alinhadas com os princípios da prevenção e precaução, visando evitar danos
ambientais. Apenas foi construindo próximo ao esgoto, mas conforme já
demonstrado acima, toda as demais casas construíram em cima da própria
tubulação, ou sejam qual foi a falta de prevenção que o acusado não deu a
devida cautela?
b)
Código Florestal (Lei nº 12.651/2012)
A Lei nº 12.651/2012
(Código Florestal) estabelece normas gerais sobre a proteção da vegetação,
áreas de Preservação Permanente (APP) e as áreas de uso restrito. No entanto, a
aplicação de tais normas deve considerar as ações (ou a falta delas) realizadas
pelo poder público na gestão ambiental urbana.
A Lei nº 12.651/2012
(Código Florestal), em seus artigos 8º e 9º, permite intervenções e exceções
em Áreas de Preservação Permanente (APP) em casos de utilidade pública,
interesse social ou baixo
impacto ambiental, o que pode ser aplicado ao caso em tela, dada
a necessidade de moradia e a ausência de alternativas
habitacionais ao Requerente.
Ademais, a Lei nº
12.651/2012 (Código Florestal), em seus artigos que tratam das Áreas de
Preservação Permanente (APP), deve ser interpretada considerando-se a função
social da propriedade e a justa expectativa do proprietário, que agiu
de boa-fé, diante da omissão do poder público.
c)
Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001)
Adicionalmente o artigo
40, parágrafo 4º: que planos diretores podem estabelecer normas de edificação,
uso e ocupação do solo urbano, incluindo a possibilidade de regularização de
construções em áreas de risco, desde que não haja comprometimento da
segurança dos moradores.
Este dispositivo legal
menciona a possibilidade de regularização de construções em áreas de risco,
contanto que não haja comprometimento da segurança dos moradores. Embora o foco
seja a segurança, esse artigo pode ser utilizado para argumentar a favor da
regularização de construções em APPs, desde que se comprove a inexistência de
risco ou dano ambiental.
d)
Inexistência de Dano Ambiental
Apresentar evidências,
ou laudos técnicos, que comprovem construção, esta não causou dano ambiental
significativo ou que qualquer impacto pode ser mitigado. Isso
fortalece a alegação de que a construção se enquadra nas exceções previstas
pelo Código Florestal. Como já mencionado acima.
e)
Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981)
A Lei da Política
Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981), que estabelece critérios para
avaliação de dano ambiental, enfatizando a necessidade de
demonstração efetiva de prejuízo ao meio ambiente para que se configure
a responsabilidade por dano ambiental.
f)
Omissão do Poder Público
A falta de ação do
poder público em fornecer alternativas de moradia adequadas ou em gerir
adequadamente a ocupação do solo urbano contribui para situações onde cidadãos
se veem forçados a construir em áreas não ideais. Portanto deve haver ponderação
entre a necessidade de preservação ambiental e as necessidades humanas
básicas.
g)
Princípio da Proporcionalidade
A ordem de demolição é
uma medida desproporcional, especialmente se a construção não
causou dano ambiental significativo e existem formas de regularizar a
situação, preservando tanto o meio ambiente quanto os direitos do Requerente à
moradia.
VI.
JURISPRUDÊNCIAS
Muito embora seja objetiva
a responsabilidade nos casos que envolvem a matéria ambiental, não se
dispensa a comprovação do prejuízo e do nexo de causalidade, não
sendo autorizado inferir dano a partir de mera constatação de descumprimento de
norma administrativa.
Nesse sentido segue a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL
CIVIL E AMBIENTAL - VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA - MANUTENÇÃO
DE AVES SILVESTRES EM CATIVEIRO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO AGENTE POLUIDOR
- AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO ADMINISTRATIVA - RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO
AMBIENTAL NÃO COMPROVADO.
1.
Não ocorre ofensa ao art. 535, II, do CPC, se o Tribunal de origem decide,
fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide.
2.
A responsabilidade civil objetiva por dano ambiental não exclui a comprovação
da efetiva ocorrência de dano e do nexo de causalidade com a conduta do agente,
pois estes são elementos essenciais ao reconhecimento do direito de reparação. 3.
Em regra, o descumprimento de norma administrativa não configura dano ambiental presumido. 4. Ressalva-se a
possibilidade de se manejar ação própria para condenar o particular nas sanções
por desatendimento de exigências administrativas, ou eventual cometimento de
infração penal ambiental.
5.
Recurso especial não provido. ( REsp 1140549/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON,
SEGUNDA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 14/04/2010) – (GRIFO NOSSO).
ADMINISTRATIVO.
IBAMA. APLICAÇÃO DE MULTA. INFRAÇÃO AMBIENTAL. ARMAZENAMENTO DE MADEIRA
PROVENIENTE DE VENDAVAL OCORRIDO NA REGIÃO. EXISTÊNCIA DE TAC. COMPROVADA
BOA-FÉ. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ.
1.
A responsabilidade é objetiva; dispensa-se, portanto, a comprovação de culpa,
entretanto há de constatar o nexo causal entre a ação ou omissão e o
dano causado, para configurar a responsabilidade. 2. A Corte de origem,
com espeque no contexto fático dos autos, afastou a multa administrativa.
Incidência da Súmula 7/STJ.
Agravo
regimental improvido. ( AgRg no REsp 1277638/SC, Rel. Ministro HUMBERTO
MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/05/2013, DJe 16/05/2013) (GRIFO NOSSO).
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEMOLIÇÃO. DANO
AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. NÃO COMPROVAÇÃO DO DANO. 1.
Aplicável o Código Florestal às áreas urbanas, nos termos do art. 2o, parágrafo
único da referida legislação. 2. Inexistindo comprovação do dano ao
meio-ambiente pela construção de muro em área de preservação permanente, e
existindo laudo pericial nos autos informando que a demolição traria mais
prejuízos ecológicos do que benefícios, deve ser indeferido o pleito demolitório. 3. Apelação
desprovida.
(TRF-4
- AC: 50028891120114047208 SC 5002889-11.2011.4.04.7208, Relator: CARLOS
EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Data de Julgamento: 30/11/2011, TERCEIRA TURMA)
APELAÇÃO
CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL.
CONSTRUÇÃO DE CASA EM CONDOMÍNIO RESIDENCIAL ÀS MARGENS DE BARRAGEM. DANO
AMBIENTAL NÃO COMPROVADO. 1. A legislação ambiental é clara ao definir como
objetiva a responsabilidade do causador de dano ambiental. Contudo, no
presente caso, em que pese restar incontroversa a construção da casa às
margens da barragem do Salto, não houve a comprovação da existência de
dano ambiental. Assim, muito embora seja objetiva a responsabilidade, não
se dispensa a comprovação do prejuízo e do nexo de causalidade, não sendo autorizado inferir
dano a partir de mera constatação de descumprimento de norma administrativa.
2. No caso concreto, os laudos periciais elaborados por profissionais
desvinculados das partes devem prevalecer, inexistindo dano ambiental
significativo, passível de reparação pelos réus. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação
Cível Nº 70080719438, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Ricardo Torres Hermann, Julgado em 24/04/2019).
(TJ-RS
- AC: 70080719438 RS, Relator: Ricardo Torres Hermann, Data de Julgamento:
24/04/2019, Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia
16/05/2019). (GRIFO NOSSO).
Note que o magistrado
acima afirma que: a legislação ambiental é clara ao definir como objetiva a
responsabilidade do causador de dano ambiental. Contudo, no presente caso, em
que pese restar incontroverso que houve a construção de uma casa em Zona de
Preservação Ambiental com Uso Antrópico, às margens do reservatório do Salto,
entendo que, com correção, decidiu o magistrado singular ao julgar improcedente
o pedido de elaboração de PRAD, em razão de não haver comprovação da
existência de dano ambiental.
Igual ao caso dos
autos, não tem como elaborar o prad, em razão de não haver comprovação do dano
ambiental.
No presente caso, não foram
realizadas perícias no local, não se concluindo, pela inexistência de
degradação ambiental em decorrência da construção erigida pelo acusado.
Há no caso dos autos impossibilidade
de recuperação da área de preservação permanente no local sem a
descaracterização da casa, pois se demolir a parte construída abalará toda a
estrutura que lá havia antes, e a impossibilidade de uso antrópico, sendo que a
falta de manutenção na área prevendo regeneração seria pouco efetiva do ponto
de vista ambiental e poderia acarretar em riscos à segurança do morador, tanto
quanto a presença de animais peçonhentos e/ou vetores de doenças e mesmo acesso
e esconderijo de pessoas estranhas ao local.
Desta forma, sem laudos periciais, elaborados
por profissionais desvinculados das partes, devem prevalecer, inexistindo dano
ambiental a ser reparado.
Outrossim, o fato de o
Ministério Público tenha apenas sugerido medidas que mitigariam danos
paisagísticos não implica, de modo algum, na obrigatoriedade de adoção das
sugestões, até porque, como ressaltado pelo experto, “a única intervenção
apontada seria do ponto de vista estético, uma vez que não foi movimentado
solo, não houve retirada de vegetação, além de não ter sido visível outro tipo
de poluição ambiental” apenas foi construída área para cima, de área que já
existia, pois ali era um porão com andar já construído em cima, e já havia
calçada antes de ser fechado o local com alvenaria.
VII.
DOS PEDIDOS
Diante do exposto,
M.M. Juiz, por justiça e Equidade, considerando as circunstâncias específicas
do caso, incluindo a omissão do poder público e a necessidade de moradia do
Requerente. Requer:
a)
O
reconhecimento da inexistência de dano ambiental causado pela construção da
residência do Requerente; em virtude da comprovação de que a situação de sua
propriedade não difere daquelas observadas em imóveis vizinhos, todos situados
em área de intervenção incompleta pelo poder público;
b)
A
improcedência do pedido de demolição da casa, considerando a omissão da
Prefeitura em realizar as obras de infraestrutura necessárias e a inexistência
de alternativa habitacional ao Requerente; e considerando a
desproporcionalidade da medida e o impacto social que acarretaria ao
Requerente, que utilizou seus recursos para construir sua moradia, confiando na
regularização futura pela administração pública;
c)
A
aplicação dos dispositivos legais que permitem a regularização da construção
em questão, garantindo o direito à moradia digna; A regularização do imóvel,
conforme solicitado pelo Ministério Público, seja realizada de forma isonômica,
considerando-se todas as residências em situação similar na região, e que se
busquem soluções que não prejudiquem o Requerente, que agiu de boa-fé.
d)
A responsabilização do poder público pela
regularização da área, com a conclusão das obras de tubulação necessárias,
assegurando, assim, a proteção ambiental e a justiça social.
Nesses
termos,
Pede
deferimento.
Blumenau, 26 de junho de 2024.